Aconteceu, no dia 29/04/2019, em Belo Horizonte, o seminário Reformas Previdenciária e Tributária, realizado pelo Instituto de Estudos Fiscais (IEFi), que contou com a participação de professores, representantes de governo e da vice-presidente de Política de Classe da ANFIP-MG, vice-presidente de Assuntos Parlamentares da ANFIP e coordenadora da Frente Mineira Popular em Defesa da Previdência Social, Ilva Franca.
Debate sobre a reforma da Previdência
O primeiro painel, que contou com a participação de Ilva Franca, tratou sobre a reforma da Previdência e foi presidido pela diretora executiva do IEFi, Janaína Diniz Ferreira de Andrade. A primeira palestra foi proferida pelo professor de Direito Previdenciário da PUC Minas, Matheus Mendonça, que criticou alguns pontos da PEC 6/2019, como a desconstitucionalização e a capitalização, além de indagar sobre qual modelo de seguridade social seria apropriada para a fase atual do capitalismo.
Sobre a capitalização afirmou que essa “não é uma discussão eminentemente técnica. É uma discussão política, de qual modelo de sociedade que queremos adotar. O modelo de capitalização é um modelo de sociedade individualista e egoísta, onde cada pessoa se preocupa com seu bem-estar social e que todos os outros não têm a menor importância”, sustentou.
Em seguida, Ilva Franca fez uma exposição dos principais pontos do sistema previdenciário brasileiro que serão alterados caso a PEC 6/2019 seja aprovada nos termos propostos e declarou que “essa PEC é draconiana, pior do que a anterior, a PEC 287/2016. Entendemos que há necessidade de reforma, mas uma que não retire direitos sociais dos trabalhadores e da sociedade como um todo”, disse.
Inicialmente, Franca relacionou as motivações para a reforma, como a crise fiscal, a evolução demográfica, o equilíbrio financeiro atuarial (cujo estudo não foi apresentado pelo governo, lembrou) e o Teto de Gastos (EC 95/16).
Posteriormente, apontou como falácias — de acordo com ela — alguns propósitos que o governo espera com mudança: sistema justo e igualitário, quem ganha menos paga menos, maior proteção social do idoso, garantia de direitos adquiridos, dentre outros.
Franca também fez questão de lembrar supostos desvios de receitas previdenciárias feitas ao longo dos anos, como a construção de Brasília, da ponte Rio-Niterói, da Transamazônica e saldos apropriados pela União entre 1966 e 1999. “É recurso que foi retirado da Previdência, que a partir de 2016 passou a apresentar déficit, segundo estudo que a ANFIP publica todos os anos, utilizando dados oficiais do governo”, pontuou.
Ilva Franca apontou os aspectos gerais da PEC 6/2019, com destaque para a desconstitucionalização e o regime de capitalização.
A desconstitucionalização, segundo ela, pode proporcionar o que aconteceu com a reforma trabalhista e a tercerização. “Aprovaram na calada da noite, pois não havia necessidade de quórum qualificado. É o que querem fazer com a Previdência. Desconstitucionalizar para, posteriormente, fazerem alterações sem maiores entraves”, disse.
“Já a capitalização é um modelo baseado no individualismo. O trabalhador vai colocar o dinheiro em um banco privado e nem o patrão nem o governo vão depositar sua parte. Imaginem se isso tem condição de dar certo? No Chile não deu. As pessoas que estão aposentando lá agora estão até suicidando, pois o benefício delas não dá para nada”, informou.
Franca ainda fez questão de frisar que as regras de transição são extremamente draconianas, promovendo rupturas para quem já está no mercado de trabalho, seja nas empresas privadas e, principalmente, no serviço público.
Outro ponto que ela destacou é o aumento das alíquotas de contribuição previdenciária, sobretudo as dos servidores públicos, que podem chegar a 22% da remuneração. “Os servidores públicos contribuem sobre toda a remuneração. Então, fazendo o cálculo, verifico que o montante gerado pela minha contribuição durante toda minha vida laboral daria para custear minha aposentadoria por mais tempo do que seria minha sobrevida”, afirmou.
Ilva Franca defendeu que o que a Previdência precisa é de ajustes, de gestões competentes e sugeriu algumas modificações. De acordo com ela, é necessário fazer revisão ou extinguir desonerações das contribuições previdenciárias sobre a folha de pagamento das empresas; revisar as isenções previdenciárias para entidades filantrópicas; alienar imóveis da Previdência e de outros patrimônios em desuso; extinguir a aplicação da DRU sobre o orçamento da Seguridade Social; criar mecanismos mais ágeis para a cobrança da dívida ativa da Previdência Social (a CPI da Previdência que foi feita ano passado demonstrou que o valor está na ordem de R$ 450 bilhões); revisar as alíquotas do setor do agronegócio; e melhorar a fiscalização. “Em 2007, 4.180 Auditores-Fiscais estavam envolvidos com a fiscalização da Previdência. Em 2017, esse número estava em cerca de 800”, lamentou.
Por fim, Franca afirmou que a única forma de impedir uma reforma prejudicial é todos se unirem. “Trabalhadores, servidores públicos, aposentados, pensionistas, jovens, idosos e toda a sociedade, devem se manifestar. Temos que fortalecer nossas mobilizações, atos públicos e os trabalhos parlamentares. Não à desconstitucionalização, ao regime de capitalização e à retirada de direitos”, defendeu.
A última apresentação do primeiro painel foi feita pela Auditora-Fiscal e professora de Direito Previdenciário da PUC Minas, Miriam Denise Xavier Lazarini, que posicionou-se contra a desconstitucionalização, a capitalização, o aumento da alíquota de contribuição, mas defendeu que há déficit e que a reforma é necessária. “Em termos percentuais do PIB, um gasto de 5,3% do PIB lá em 2009 virou 6,8% em 2018. Então, a existência do déficit, acredito eu, é incontroversa”, afirmou.
A professora também disse que é imprescindível considerar a evolução demográfica, a mudança da pirâmide etária. “Para se ter ideia, nos dados do censo, em 1960, a expectativa de vida ao nascer do brasileiro era de 48 anos. Em 2010, 73. Hoje, é de 76. Em 1960, havia 6,3 filhos por mulher. Hoje, 1,7. Então, o casal não consegue nem se repor na sociedade. E no sistema de repartição simples utilizado hoje é a população ativa que sustenta a inativa. Se não conseguimos nem repor a quantidade, o que vai acontecer tendo em vista a longevidade dos idosos?”, indagou.
Por fim, Miriam apontou como uma das consequências do déficit na Previdência a mitigação do fator previdenciário, com a implantação da fórmula 85/95 — quando houve uma corrida para a concessão de benefícios — e defendeu o fim da aposentadoria por tempo de contribuição. “Isso é desigualdade mesmo. Acaba conseguindo aposentar por tempo de contribuição só a parcela mais rica da população. As pessoas do nível mais baixo, necessariamente, já se aposentam por idade”, pontuou.
O segundo painel teve como presidente da mesa o diretor executivo do IEFi, Pedro Eliezer Maia, e contou com apresentações do professor de Direito Previdenciário da UERJ, Fábio Zambitte; com o ex-ministro da Previdência, Carlos Gabas; e com o subsecretário do Regime Geral de Previdência Social do governo federal, Rogério Nagamine Costanzi.
O professor Fábio Zambitte também entende que, do ponto de vista atuarial, o modelo previdenciário brasileiro merece uma adequação, mas a questão é, de acordo com ele, como construir uma reforma previdenciária de maneira que a Previdência Social não perca seu objetivo, que é a questão da solidariedade e da inclusão social, considerando o desafio da sustentabilidade. “Construir um modelo previdenciário que tenha foco, exclusivamente, no aspecto econômico, não faz sentido, até porque o objetivo dela é amparar trabalhadores e dependentes diante dos infortúnios da vida”, defendeu.
Por isso, diante do ideal da solidariedade, a proposta de um regime de capitalização, segundo o professor, parece incongruente. “O modelo de repartição acaba sendo mais adequado para o pilar básico de proteção e é o que tem sido a regra no mundo, embora apresente seus problemas, como a própria capitalização também tenha os seus”, observou. “Mas isso não impede que modelos híbridos sejam adotados, a exemplo do Canadá nos anos 90”, completou.
Fábio Zambitte defende que o Brasil faça uma mudança estrutural, deixando de lado o arcabouço do seguro social e migrando, em alguma medida, para o pilar universal de proteção. “O modelo bismarckiano nunca teve vocação para ser um modelo universal. Um modelo protetivo de previdência que demande contribuição prévia à concessão de benefício, qualidade de segurado, carência, filiação nunca vai ser universal. Esse é o problema que enfrentamos hoje”, argumentou.
Em seguida, o ex-ministro da Previdência, Carlos Gabas, defendeu um maior debate e transparência por parte do governo em relação à reforma, a qual ele não reconhece como tal. “Não reconheço isso como uma reforma. Na verdade, o que estão propondo é um ajuste fiscal que está sendo colocado na conta de parte da sociedade sem nem perguntarem se ela tem condições de suportar e sem ouvir ninguém. Eu defendo uma reforma da Previdência, pois precisamos de um sistema de proteção social que tenha viabilidade e sustentabilidade. A razão de dependência está ficando complicada. A quantidade de pessoas contribuindo em relação ao número de aposentados vai trazer um desafio enorme para a Previdência. Aliás, são vários os desafios. A transição demográfica é uma delas”, pontuou.
Para Gabas, o que está em discussão é o papel do Estado. “A decisão política que o Congresso vai tomar é se o orçamento da União protege as pessoas ou se continua acumulando recursos para o capital especulativo. Não estou simplificando a história. Existem formas de se proteger fazendo uma reforma e organizando fonte de financiamento. Os países que passaram por esse desafio reorganizaram fonte de financiamento. O que precisa ser feito no Brasil é redistribuir essa carga de acordo com o potencial das pessoas”, defendeu.
Posicionamento do governo
A última palestra do primeiro painel foi do subsecretário do Regime Geral de Previdência Social do governo federal, Rogério Nagamine Costanzi, que fez uma apresentação eminentemente técnica, baseada em números, especialmente os que dizem respeito à questão demográfica e suas consequências no sistema. “Sem alteração das regras previdenciárias, jogaremos um custo muito alto para as gerações futuras. Temos uma despesa alta com a Previdência que cresce a um ritmo insustentável. Ou isso vira aumento de carga tributária ou aumento da dívida pública e diminuição de recursos para outras áreas”, afirmou.
Ele pontuou que as principais preocupações em relação à reforma são garantir a sustentabilidade do sistema e pensar nas gerações futuras (quando a relação de ativos/inativos diminuirá). “E o que estamos chamando de nova Previdência não é só a PEC 6/2019. Na verdade é um conjunto de medidas que visam também reduzir a dívida ativa”, esclareceu.
Para Costanzi, se a reforma não for feita, o país vai gastar mais com juros da dívida no futuro. “As pessoas que são contra o ajuste fiscal e acha que banqueiros estão sendo beneficiados não entendem que o propósito desse ajuste é justamente acabar com a explosão da dívida. É essa escolha que estamos tomando”, argumentou.
Reforma tributária
Na segunda parte do seminário, especialistas debateram a reforma tributária, ocasião em que Ilva Franca aproveitou para falar do projeto Reforma Tributária Solidária, da ANFIP, em parceria com a Fenafisco.
Franca ressaltou que a Reforma Tributária Solidária visa propor uma redução dos impostos sobre o consumo, que tanto afetam o trabalhador e a classe média. Em contrapartida, segundo ela, haveria um aumento de tributação sobre as grandes riquezas, sobre a renda e os dividendos. “O atual sistema tributário é injusto e regressivo e isso é uma das principais causas da desigualdade social no Brasil”, afirmou.
Franca aproveitou para informar sobre o lançamento da Frente Parlamentar Mista da Reforma Tributária no Congresso Nacional (veja aqui) e que em todos os estados serão criadas frentes parlamentares da reforma tributária, “para que o projeto seja debatido nas Assembleias Legislativas, nas Câmaras Municipais e com a sociedade, a fim de que se fortaleça a proposta de uma reforma justa e solidária para toda a sociedade”, destacou.
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